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Jornalismo de Negócios, Robalo e Merluza

Duas capas recentes de periódicos da mídia escrita brasileira colocaram em pauta de modo caricatural os porquês do jornalismo escrito brasileiro.
A primeira é a capa da revista Veja, de duas semanas atrás, em meio à hecatombe financeira mundial com epicentro em Wall Street, com uma foto de um Tio Sam muito convincente, apontando dedo em riste pra gente e nos dizendo em letras garrafais: “- Eu te salvei!” (referência ao pacotinho de US$ 700 bi com o qual os contribuintes dos EUA vão pagar pelas estripulias especulativas do Merril Linch, Lemann Brothers (brother de quem?), et caterva).


A primeira pergunta que me assaltou quando vi a tal capa (faz anos que tenho por princípio higiênico me comunicar com a Veja somente de longe e pelas capas) foi perguntar, como faria o Mingo, do Daniel Boone: “- Salvou a quem, cara-pálida?”.
Talvez a melhor resposta a essa capa da Veja tenha sido a capa da Carta Capital, na semana seguinte, como o mesmo Tio Sam em sua cartola azul e vermelha e a frase: “Ele não salva ninguém”.

Fiquei pensando o que levaria um jornalista ou um editor inteligente (deve haver algum lá) a “bolar” uma capa daquelas. Afinal, a comparação mais boazinha que me ocorre é a de um seqüestrador que, arrependido, liberta a vítima e liga pros parentes dizendo: “- Eu salvei fulano (a vítima)!”.
Se nem nos Estados Unidos parece haver hoje algum órgão de imprensa tão submisso e serviçal ao poderio do império financeiro, a ponto de transformar em herói dessa história toda um Estado e um governo que fizeram a festa da desregulamentação e da especulação e que são os cúmplices mais evidentes do colapso, a quem a Veja está servindo? Certamente não é ao Brasil...
A outra capa é a do Correio Braziliense do dia seguinte ao primeiro turno das eleições municipais de 2008: “PMDB ganha força nas urnas, já o PT...” (sempre as letras garrafais). Como em Brasília não há eleição e, por motivos particulares, não estava podendo acompanhar as eleições no país, pensei: o PMDB deve ter “arrebentado a boca do balão” e o PT sofrido uma derrota fragorosa.

Todavia, analisando os dados, das 15 capitais onde houve vitória no primeiro turno, o PT elegeu o prefeito de 6, o PMDB de 2.
No cômputo geral das cidades do país, o PMDB foi de fato o partido que mais vitórias obteve: 1.194, um crescimento de 13% em relação ao número de vitórias de 2004. Ou seja, o PMDB que já era o maior partido do país em número de prefeitos, consolidou essa posição. Aliás, sem recuperar o patamar de 2000, quando tinha 1.258 prefeitos, o PMDB volta a crescer em número de prefeituras depois de 20 anos seguidos de recuo.


Já o PT vem crescendo sistematicamente em número de prefeituras desde 1988 e agora, com os 548 eleitos até o momento, já elegeu 33% de prefeitos a mais do havia eleito em 2004.
Agora, falando francamente, esses dados justificam minimamente uma manchete daquelas? Considerando que o PMDB é um partido da base do Governo, que muitos candidatos eleitos do PMDB tem o PT como vice (caso de Íris Rezende) e que os principais partidos de oposição perderam prefeitos em relação às últimas eleições (o PSDB 10%, e o DEM 38%) tem algum fundamento ou justificativa jornalística aquela manchete?


Pelo jeito, qualquer veleidade, já não digo de imparcialidade, mas de serenidade ao menos, já foi pras calendas (ou seria melhor dizer cucúias?).

Que tipo de negócio justifica tais desvarios? Negócios jornalísticos? Interesse em agradar a alguém do PMDB, pagar alguma dívida? O nível de alienação da realidade nos autoriza a especular. A manchete parece também um arroubo de satisfação pessoal do editor, resultado de uma aposta que ele fez com alguém de que o PT não varreria o país com uma “onda vermelha”.

Qual o interesse informativo dessa aposta para você, para mim e para os leitores em geral?
A continuar assim, o melhor negócio a fazer com esse tipo de imprensa vai ser o que faziam nossos avós depois de uma lida rápida no noticiário: embrulhar robalo e merluza comprados fresquinhos na banca do japonês na Feira do Guará.
Kleber Chagas Cerqueira
Consultor Legislativo da Câmara Legislativa

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